... para mim foi de Poesia. Que melhor forma de fugir ao comum dos dias e datas precários? Aniversários de nascimentos e mortes: tantas as pessoas e coisas desaparecidas. Os poemas e os poetas são uma forma de lembrar e me ligar ao Infinito.
Vários temas semanais. Sobre o primeiro desafio, "Carnaval": desvio de passagem por Lazarim, visitar o Centro Interpretativo da Máscara Ibérica, um museu muito completo e inesperado, e passear pela aldeia com as suas bancas de madeira onde se modelam "os caretos", à mão, grandes e pequenos. Estes, verdadeiras obras de arte miniaturais.
O poema de José Afonso, (parte) do cantar tradicional da Beira Baixa: "Moda do Entrudo"
" - Ó
entrudo ó entrudo
Ó entrudo chocalheiro
Que não deixas assentar
As mocinhas ao solheiro..."
Seguindo-se a semana do "Dia dos Namorados", importação de (mau) folclore e comércio (muito). Lembrei Eugénio de Andrade, o eterno enamorado:
Jardim do Passeio Alegre, onde vivia o Poeta que assim fala das suas "palmeiras". Excerto do livro "Poesia", de 1992, "Rente ao dizer", rente à Foz do Douro:"Chegaram tarde à minha vida
as palmeiras. Em Marraquexe vi uma
que Ulisses teria comparado
a Nausica, mas só
no jardim do Passeio Alegre
comecei a amá-las. São altas
como os marinheiros de Homero.
Diante do mar desafiam os ventos
vindos do norte e do sul,
do leste e do oeste,
para as dobrar pela cintura.
Invulneráveis — assim nuas"
Eugénio de Andrade (Rente ao Dizer, "Poesia" 1992)O Dia do Pai, que será mais à frente no calendário, aqui representado pelo reflexo de um menino num Jardim Japonês, há quantos anos!, e o poema do libanês Khahil Gibran, excerto do livro "O Profeta"
"Os vossos filhos
Não são vossos filhos (…)
Vêm por vosso meio
Mas não de vós;
E apesar de estarem convosco
Não vos pertencem.
Podeis dar-lhes o vosso amor,
Mas não os vossos pensamentos
Porque eles têm
Pensamentos próprios.
Podeis acolher os seus corpos
Mas não as suas almas
Porque as suas almas
Habitam a casa de amanhã
Que não podeis visitar
Nem sequer em sonhos.
Podeis esforçar-vos
Por ser como eles
Mas não tenteis fazê-los
Como vós
Porque a vida não vai para trás
Nem se detém com o ontem (…)"
A última semana deste mês, (o tema proposto: o fim do Inverno climatológico), traz uma vista dos socalcos no Douro e o poema de Bertolt Brecht, nesta época de guerra e destruição: um hino poético sobre reconstrução e esperança. Apesar de tantas casas desertas do humano sentir e viver, entre as oliveiras solenes florescem as amendoeiras rosadas.
Digo, penso, olhando esta fotografia: porque começa a idade de
ouro/rejuvenescimento: Primavera
"Toma o teu lugar na mesa, foste tu que a puseste.
A partir de hoje vestirá o vestido aquela que o coseu.
Hoje ao meio dia em ponto
Começa a idade de ouro.
Nós vamos inaugurá-la por sabermos que
Estais fartos de construir casas
Que jamais habitais. Queremos crer
Que doravante ireis comer o pão que cozeste.
Mãe, que o teu filho coma.
A guerra foi anulada. Pensamos que isso
Seria melhor para ti. Porque, dissemos com os nossos botões,
Adiar ainda mais a idade de ouro?
Nós não somos eternos."
Poemas de Beltolt Brecht
Selecção e estudo de Arnaldo Saraiva, Editorial Presença
(livro comprado em Maio de 1968)
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Assim, foram os poetas que me ligaram aos pensamentos. O tal Infinito intemporal.