quarta-feira, março 28, 2007

Vida e Teatro














Ontem não consegui resistir ao chamamento da flor e às cores.


Era dia do Teatro! Os dias disto e daquilo têm uma vantagem particular: lembrar o que no quotidiano existe e esquecemos. Todos.


Noite em que vi novos e velhos actores. Alguns do tempo da "Voz", não havia televisão, o rádio trazia-nos os poetas da palavra dita. Vozes que guardo ainda no silêncio, uma língua musicada, forte, brava e doce. A nossa língua modulada e correcta, sem erros. Falava-se bem.



Estive num palco com 8 ou 9 anos, teatro amador de crianças. No liceu, as peças de Gil Vicente e "A Barca do Inferno". Se foram obrigatórias, ainda bem: os alforges míticos das crianças recolhem todas as migalhas de vida.

Percebo a paixão, a punção da máscara, o gosto de declamar, dizer e desdizer, mudar de pele.

Há uma menina que anda como se dançasse, que se move como se não pousasse os pés no chão, que paira naquele momento suspenso entre o salto e o solo. Faz caretas, imita os bichos, ri-se em catarata. Os olhares de gazela, de mulher, de criança. Adulta jovem.
Para ela, os cantos esculpidos dum teatro sério e bonito.

Escada que sobe a tua vida, ao fundo as flores do futuro e do teu contentamento.


O Rivoli: daria lucro no tempo das manhãs clássicas de domingo, onde o Maestro explicava a música, éramos todos novos e levávamos os filhos pela mão?

- Não me reconheçam, nem me procurem, estou nos bastidores -


Irregulares












Como o tempo, as estações do ano e os meus momentos.

Avisada gentilmente que atingi o 100º post, nada melhor que ir buscar as camélias do Senhor Paulino Curval, na sua Quinta de Vilar de Matos, aquele sítio encantado onde se passeia como no Paraíso.
As suas mãos de Arcanjo. O seu riso Santo. As arcadas das estufas como se Catedrais.

Ir e trazer as camélias e as magnólias, antes que o frio e o vento inopinados lhes levem as flores

Há anos, desenhava e pintava eu para a minha criança: uma magnólia na esquina da rua da escola, flores taças dum rosa vivo, rebentando para o passeio sem que ninguém as saudasse.

Desenhava e pintava o mapa de Portugal, com cachos de uva no Douro, presunto em Lamego, peixes no mar, pinhais em Leiria, barcos na Nazaré, trigo no Alentejo, sol no Algarve.

Naquela rua havia mais árvores, mais espaço, mais flores. Hoje há mais prédios, mais bancos que prometem a melhor taxa, todos.
Naquele mapa, havia rios e lugares, símbolos de vida, cultura.

Hoje, talvez tivesse que assinalar à minha criança os centros comerciais. Onde se esquecem as cores do ar e nos reflectimos em montras, quais lagos espelhos de bens supérfluos.

Nas lojas gourmet compro todos os produtos do mundo, nas feiras do fumeiro chegam-me os cheiros do campo.
Alegremente tabelados.
Metalizados, higienizados, cintilantes, normalizados.
Self service de sentimentos, prateleiras de desejos.
Esta é a centésima vez que me queixo da sociedade e me refugio em sonhos. Veladamente ou descarada.
Nada melhor que as flores para esconder a mágoa ou celebrar a outra vida que queria viver.















quarta-feira, março 21, 2007

Dias para relembrar




Dia Mundial da Poesia
Sentido mais como um "Estado de Alma"


"Toma o teu lugar na mesa, foste tu que a puseste.
A partir de hoje vestirá o vestido aquela que o coseu.
Hoje ao meio dia em ponto
Começa a idade de ouro.

Nós vamos inaugurá-la por sabermos que
Estais fartos de construir casas
Que jamais habitais. Queremos crer
Que doravante ireis comer o pão que cozeste.

Mãe, que o teu filho coma.
A guerra foi anulada. Pensamos que issso
Seria melhor para ti. Porque, dissemos com os nossos botões,
Adiar ainda mais a idade de ouro?
Nós não somos eternos."

"Poemas" de Bertolt Brecht
Selecção e estudo de Arnaldo Saraiva, Editorial Presença
(livro comprado em Maio de 1968)

Porque a Poesia também planta crianças da Paz.
(Sábado 17 de Março, Concentração pela Paz em várias cidades do Mundo
- Porto, Praça D. João I)


Aqui está



...a minha "sagração" da nova companhia que vamos ter 3 meses!!! Mesmo o frio sentido, não a faz esquecer de chegar. Descalça e brilhante.

Não flores agora. Depois.

Tenho clientes em carteira; ou seja, a minha "firma" de troca e venda de palavras, ternuras e enfeites, tem ainda as meninas magnólias e camélias na calha da brisa.

Saudação em postais dos princípios do século. Isto dá-me como febre, por vezes.

.....

DEI (depois de escrito isto): não esqueçam o museu de Odrinhas, já ali abaixo, o cheiro de Primavera deve ser estonteante, lá...

segunda-feira, março 19, 2007

Um regresso a Odrinhas












Sintra que sempre murmura uma harpa de encantamento. Serra sagrada com o seu horizonte e os seus milénios de história, onde antepassados vindos da Europa e do Mediterrâneo convergiam em diversos saberes e religiões.

O Museu Arqueológico de S. Miguel de Odrinhas e a adjacente Escola Profissional de Recuperação do Património de Sintra. As minhas palavras vivas em 6 de Julho do ano passado,
sobre este lugar especial. Em pleno meio rural.
Centenas de monumentos funerários, vestígios de cidade romana, desenhos que nos habituamos a ver nos livros e ali - no "Livro de Pedra" - podemos tocar. Aprender a ler ..."filho de, família de ..."; uma dedicatória a uma escrava, numa das lápides, fez-me sorrir de puro deleite.
Os sarcófagos etruscos, trazidos por Sir Francis Cook para ornamento da sua Quinta da Regaleira, ali estão, dignos. Estátuas soerguidas em leito de pedra, olham-nos do fundo do tempo na sua cripta de penumbra.
Fora do Museu, o espaço tem uma aura divinal no ar, nas cores do musgo e pequenas flores do monte, os nossos passos cautelosos por cima de passos antigos. Um pátio com reminiscências árabes, o lago, uma amoreira plantada na "Ágora", convocam-nos para uma reunião de culturas.

A lápide na parede refere que, em 1955, a vontade do povo desse lugar foi conservar o seu núcleo museológico, ali mesmo, onde se deu o encontro com o Passado, mais tarde transformado em Museu.
Nesses anos pardacentos, uma atitude cívica era resistência, era revolucionária.
No Palavra Puxa Palavra, a minha ideia de civismo vai para estas gentes.
E tenho o prazer de rever as horas dessa visita, com as minhas fotografias, com a minha compreensão da História. Com gosto também de ter visto que crianças fazem desenhos, que grupos se organizam para fruição daquele espaço, o auditório se abre à Palavra.

Conheço museus, não muitos, alguns. Este tem uma ligação ao lugar que transcende a estrada que nos conduz até lá: de repente, um oásis de saber. É nosso.




quinta-feira, março 15, 2007

Cores




Lembrei-me, de repente, que estas cores escolhidas há dias ficariam bem aqui.
Que andamos a acenar a um tempo esperançoso. Há uma semana que o ar está com cheiro verde. Um alvoroço de asas.

Estive mais de duas horas no Paraíso, um viveiro de camélias ...milhares: hei-de falar delas. Tenho de divinizar o que é divino e singelo: um homem de 70 e muitos anos e eu, temos gostos comuns, por exemplo, beijar e acariciar as flores que mais gostam. Neste espaço, trocamos beijos em camélias, cabeças cor de rosa, brancas, vermelhas ...

Sem terra, eu, aqui deixo as cores que alegram os sítios humildes dos meus cantos.
Meu aceno alegre ao equinócio, ao equilíbrio.

sexta-feira, março 09, 2007

Antes, durante, depois





Estou atrasada, como o coelho da Alice no País das Maravilhas.
Vezes que me sinto assim. Outras não.
Ideias minhas.
Ou sou o delta do Nilo ou as cataratas Victória (escolho no mesmo continente, identifico-me ali e nunca lá fui). Com as divindades e as savanas.
Estas sequências de "Entardeceres" do PPP deixaram-me ...como dizer ...de alma aberta, como uma ferida, não grave mas dorida ainda.

Por isso, as minhas aqui, separadas. E como é difícil escolher. Tenho fins de dia a tirar fotos seguidas quando a hora é intermédia, quando as sombras se alongam e tudo muda de côr. Tudo é mais belo e passível de amar, aceitar.

Será o sol dourado terno que começa a cair, afogueado se nos toca na pele, e se despede em rosa chá, e quase transparente, verde claro, azul anil, fechar os olhos, adeus.
Como a continuação de ontem, Klimt reproduzido para meu fruto comer em casa.
Como o que o amor pensa de mim e eu dele.


quinta-feira, março 08, 2007

Vícios privados


...públicas virtudes...
Para Mr. Lynch, o estimável cidadão que foi o único, em meses, que veio atrás do meu Klimt e me perguntou por ele (o quadro que tenho no meu perfil).

Por isso o ofereço aqui, em duas poses, para que possa compará-lo com uma representação do real, em qualquer livro de Pintura. Já o vi, em Viena, foi ...emocionante.
O meu, com as diferenças, não engana ninguém nem pretende.
Tal como disse, copiei-o e pintei-o eu. É uma forma de o ter, para mim. Destes beijos (como o do Rodin) há pela casa toda, incluindo a cozinha!

Gosto muito desta ternura sugerida, desta Arte um pouco tímida. Do amor que é calma, empatia, amor generoso que roça o corpo mas arrepia o espírito.
Amor sensual, erótico mas ao mesmo tempo, vigiado por um deus Cupido e suas formas de anjo. Amor transcendente, o melhor que há.
Que é sempre dádiva. Eu dou, tu dás, confundimo-nos.

Com esta avalanche de cores, de folhas, de dourados esvaídos, esta fusão da tinta e mãos pousadas. Encostadas.
O meu Klimt copy.


segunda-feira, março 05, 2007

Março, marçagão








Reparei em sobressalto
que não tinha fexado, mesmo com xxxx, cadeado, grades,
fechado, digo, o raio do mês de Fevereiro, o raio do mês mais curto, o raio do mês em que há trovões, raio do mês de raios e terramotos, raivoso, nem carne nem peixe, nem invernostá nem primaveravem
Fecho-o, a correr.
Com uma cidade brumosa e dedinhos cor de rosa
com máscara
literatura
cinema
a força de um cavalo domado por homem
a arte de azulejos no tecto dum prédio
(familiar pelas vezes que lá parei e passei e andei)

Fecha-se, rasga-se a folha, agora é sempre a crescer
Sol que levanta a coroa um bocadinho mais alto, cada dia

E andamos tantas(os) a desejar que a nova estação nos traga um pouco menos de sabor insípido, ao engolir as bestas, de engolir difícil como indigestos são
Larápios com algum molho verde, nouvelle cuisine para ladrões de gado.

Primavera caminhando com passos de Botticelli, trazendo riso e uma golada de ar morno
um roçar de cores meigas, cores raparigas

Este amarelo de flores pequenas, em V
(...presumo daqui a uns meses bufar e dormir a sesta, como os queridos hermanos, salir pelas 5 de la tarde)
Que se vá Fevereiro pelo lameiro: não sei se existe este dizer, inventei-o agora.