quarta-feira, fevereiro 27, 2008

Muro







Lembrada que fôra de mim, vejo um muro para sentar, um pórtico para alcançar.
Ao meu encontro virá, se transpuser a porta de vidro e os fantasmas, mesmo os coloridos.
E raras vezes se julga a carne tão marmórea no pleno direito de se sentir/sentar.
Exilada e em silêncio.

terça-feira, fevereiro 26, 2008

Camélias no museu









Desta vez não falamos nem as ouvi.
Havia um céu quase chuvoso e um silêncio de pátio abandonado.
Espreitei um jardim que não é, é proíbido, foi organizado para estar vazio.
Tem portas que só se abrem para "eventos".
Das ervas magras entre pedras sistemáticas, como se as pedras vivas fossem colecção.
Modernidades escusadas.
Há secretários e ministérios vagos que tratam disso tudo. Decretam.

As pedras? As velhas fontes desterradas?
Bastaria amá-las e fruí-las, entrar e respeitar um lugar oásis da cidade.
Sei que são as mesmas velhas camélias de um antigo lugar.

Mas desta vez não trocamos palavras, observamo-nos no tempo.
Elas, floridas e resistentes a cada Inverno.

domingo, fevereiro 17, 2008

Santos e ditos velhos

Foto cedida, gentilmente e a propósito, pela Belisa do PPP. Obrigada!







"Vós, diz Cristo Senhor nosso, falando com os pregadores, sois o sal da terra; e chama-lhes sal da terra, porque quer que façam na terra o que faz o sal.
O efeito do sal é impedir a corrupção, mas quando a terra se vê tão corrupta como está a nossa, havendo tantos nela que têm ofício de sal, qual será, ou qual pode ser a causa desta corrupção?
Ou é porque o sal não salga, ou porque a terra não se deixa salgar.
Ou é porque o sal não salga, e os pregadores não pregam a verdadeira doutrina; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, sendo verdadeira a doutrina que lhe dão, a não querem receber.
Ou é porque o sal não salga, e os pregadores dizem uma cousa e fazem outra; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes querem antes imitar o que eles fazem, que fazer o que dizem.
Ou é porque o sal não salga, e os pregadores se pregam a si e não a Cristo; ou porque a terra se não deixa salgar, e os ouvintes, em vez de servir a Cristo, servem a seus apetites.
Não é tudo isto verdade?
Ainda mal."
Padre António Vieira (1608-1697)
Excerto do Sermão de Santo António aos Peixes
400 anos antes e sem ter televisão, o Pregador falava de quê?
Que aprenderam os ouvintes-peixes?

Divagações









...sempre melancólicas, num domingo como é esta fosca tarde.

Sem vontade de responder/visitar quem leu e pensou e preocupou.
Pelas minhas palavras/fotos sobre o Bolhão. Uma pequena voz.

Há um silêncio ensurdecedor e, no entanto, ouvimos um homenzinho a driblar (sim, eu também conheço o futebol) sobre o que escreveu ou não, autorizações subtis escorrendo pelas emendas das leis, sobre favorecimentos que parecem e não são. Honras de telejornal, prime time.
É que não há direito, é que não há paciência que resista.

O Bolhão? Mas quê? Esperavam uma reportagem séria, serena, esclarecedora? Antes ouvir no esconso duma rua um qualquer homem do norte... e como diz o meu amigo escrevinhador
..."tudo isto é fado"...

Imagens à volta de.
Porque a seguir, viro-me para os santos.

quarta-feira, fevereiro 13, 2008

Bolhão - a revisitar II (a alarmar)







Décadas de passeios renovados, sempre e todos os anos, nas férias dos que estão longe. De pais para filhos.
Catarina Portas escreveu uma crónica irrepreensível e sensitiva, no J. Público, sábado passado.
Na Wikipédia está esparramada a ideia peregrina - e muitos "links" de informação e alerta - do que pretendem fazer daquele lugar. Em vez de o limparem e renovarem decentemente, digo eu.

Vão pô-lo a render, a explorar por privados, durante 50 anos.

O programa de reabilitação prevê, além da graciosidade de deixar a fachada e demolir o interior, habitações de luxo, parque de estacionamento, hipermercado, centro comercial com lojas âncora (os nomes e os sabores do costume...) e, calcule-se, cerca de 3% de espaço para o comércio tradicional.

Com tantos políticos, arquitectos, engenheiros, artistas, negociantes... com tanta democracia e discussão pública, ordens e assembleias ... que posso eu dizer?
Deixar aqui a expressão da minha revolta.
Com algumas fotografias elegantes duma das minhas meninas de Verão.
E apontamentos: a beleza condenada dum emblema patrimonial da cidade.

Talvez queiram saber, os que por aqui passam, os que podem contactar e falar a mais alguém, que há um Manifesto Contra a Demolição do Bolhão (http://manifestobolhao.blogspot.com/).

Para nosso bem!
Para bem da nossa memória colectiva!

Bolhão - o mercado I









Mercado público desde 1839/51. Em Outubro de 1915, o belo edíficio projectado pelo arquitecto Correia da Silva, inaugurava as primeiras bancas e lojas do seu interior.

Não saberei fazer e escrever tudo o que me ocorre sobre este lugar que tanto frequentei.

Recém-casada e a viver perto da Baixa, ali e na Casa Chinesa, na Confeitaria do Bolhão e nas redondezas, se passavam as manhãs ou tardes de sábado nas compras da semana.

Fui vendo a minha cidade ficar mais velha, inóspita, crua e nua. Sózinha e dispersa.
Modernidades modernaças, ideias bacôcas.

Mais betão, mais alcatrão - mobilidade??? - , menos árvores, menos canteiros, menos relva, mais alumínio, mais lojas incaracterísticas, mais ruínas.

Menos pessoas.

quinta-feira, fevereiro 07, 2008

Pueril *









Lagartixas, sardaniscas: no sol e sombra em paredes da minha vida.

Muitas vezes me (as)saltam as palavras.
Esta e só esta, hoje, traduz a efemeridade de um balão (ar) ou a lenta degradação do casco que foi barco (água).

Tempo pueril, o tempo do vôo como o do flutuar.
Ah... cavalos-ideias-ideais-pueris-à solta!
Reparei que "à solta" também me surge no apontamento abaixo...
Será, que é, uma expressão de força na alma em jaula.

* do velho dicionário:
"Pueril: da puerícia; que pertence às crianças; infantil; fig. fútil; ingénuo
(lat. puerile)"