quarta-feira, janeiro 23, 2008

Memória: "O Tempo Reencontrado"









Das minhas curiosidades "relativas", segui para os apontamentos que sabia ter algures.

Sobre a abertura da rua nobre - que preserva ainda algumas casas de traça antiga, com belíssimos azulejos e jardins de traseiras - em terrenos doados pelo tio de Almeida Garrett.
Domingos do Rosário do Nascimento e Almeida possuía propriedades naquela área, ali viveu e instalou uma fábrica de chapéus no séc. XVIII.

Acerca do Palacete imponente dos ilustres fidalgos da cidade oitocentista, construído já em meados do séc. XIX, a nobre linhagem dos Albuquerques, Mellos e Cáceres
As famílias frou-frou eram donas duma das melhores cocheiras da cidade, com a entrada precisamente onde estão os plátanos e o portão.

Nasci mais longe, cem anos depois, sem fidalguia noticiosa, onde agora há ervas e o sítio eventual. Talvez no antigo lugar das palhas dos animais e no presépio que a doce avó me fez no seu regaço.

A construção luxuosa do condomínio incluíu uma área no rés-do-chão, envidraçada, virada para as traseiras, com saída para duas ruas. Esteve desocupada muito tempo e eu sempre a espreitei pelos vidros.

Recentemente, arquitectos - só pode! - decoradores, lojas de vintage, de autor e galerias de arte, foram-se instalando naquele espaço luminoso e arejado.
Algumas peças de arte são expostas pelos corredores: daí a figura geométrica negra, parecendo uma construção de diamantes lapidados, como uma amiga lembrou.

Da velha cocheira e da quinta cheia de árvores, do lugar de camélias que nunca as minhas bolas de sabão alcançaram, fez-se-me um sentimento algo pessoal, penumbroso, agudo e conhecido, tal como a escultura que encontrei no acaso.
Memória em pirueta no tempo.

segunda-feira, janeiro 21, 2008

"Em Busca do Tempo Perdido"








Com a semana do PPP e a palavra/imagem Geometria escolhida, lá fui pelos carreiros do tempo, até um lugar. Tão perto, onde vivi a infância cuidadosa e severamente guardada.
A casa aninhava-se entre duas quintas e eu espreitava as janelas, ora a da frente ora a de trás: habitava em sonho "o espaço que sonhava" para poder brincar.
A quinta em frente ocupava todo um quarteirão e estava abandonada já nesse tempo. Nunca lá vi ninguém. Só barreiras verdes, portões fechados e uma velha casa cinzenta.

As árvores, trepadeiras, heras, camélias, transbordavam pelas paredes da terra e do céu. Floresciam à medida dos meus olhos: raramente se notava a nudez do Inverno porque havia sempre uma variedade de arbustos e árvores de folha perene, onde o vento e a chuva se perdiam desencontrados um do outro.

O edifício foi parcialmente recuperado há uns anos, integrado num enorme mas esteticamente equilibrado - !vá lá, nem tudo é feio! - condomínio fechado, que mantêm o ar de mistério do lugar.
Das árvores, um adeus eterno, perpetuado unicamente em dois belíssimos plátanos na entrada. Os que recordo sentinelas do meu passar.
Então entrem o portão comigo e acariciem a pedra ainda reflexiva do meu olhar pequeno.

segunda-feira, janeiro 14, 2008

Musgo




Os amantes
da música
da arte...
São tristes os amantes que amam sós.

Um cão de pedra à chuva surgido.
Nenhumas as palavras no musgo.

Fico
outra vez, como a raiz duma árvore, procurando o alimento-água.

sábado, janeiro 12, 2008

Dobradas as décadas


Olhos líquidos azulados e fechados com força.

Ronronava como um gatito molhado e friorento.

O tempo nunca mais foi o mesmo nem parecido.
Ocupado.

Ele cresceu.
Equilíbrio da natureza.

Eu não.

segunda-feira, janeiro 07, 2008

...E coisas tolas: Loucuras II









Depois de saber - tendo acompanhado por um Telejornal profícuo em informação, como se fossem as eleições cantonais da Beira Baixa ...
Dizia eu, depois de saber que o Iowa é muito cristão evangélico e que a família americana no poder nutre uma especial afeição por este estado com nome de índio.
Inclusive que "Jesus entrou nas eleições americanas" (J. Público em 5 Jan.08).

Perdi as estribeiras e fiz um comentário especial, em directo da minha cabeça, para as minhas amigas J & J que muito prezo, aproveitando a pausa democrática, e com cheiro de santidade, neste ar conexo.
Não sendo este meu lugar senão um lugar de introspecção e amizade, e de pouca polémica que recuso, desta vez ergo o polegar opinando com sinceridade sobre a exposição.

Daqui deste meu sítio, voltei ao CCB e à colecção Berardo, para outro dia de sol imaginado e liberdade figurada.

Em equilíbrio de vidro, deito contas à vida e deixo a alma alagar-se em virtual pousio.

domingo, janeiro 06, 2008

Alguma ecologia nostálgica


No tempo em que amigos dos arrabaldes me arranjavam pinheiros das suas terras.
Do que cheirava verde em casa.
Ou a câmara os vendia, módicos, e a gente enchia as mãos de resina, a procurar o mais lindinho.
O primeiro calendário do Advento, pedi-o a um amigo da Alemanha e era uma festa abrir as portinhas e as janelas em cada dia de Dezembro. Menino que se ria, de manhã.

Irresistível, este postal que me mandaram pela época.
Arrumo as festas e os papéis.
Árvore de dobrar, dourados, estrelas, bolas e luzinhas.
Restos de frutas secas, travessas de enxoval, velas e panos vermelhos com azevinho bordado.
Mensagens e artifícios.
Algumas - poucas - verdades.
uff...até depois!

Há "loucuras"





...boas, outras más.
Esta minha sequência surgiu da semana passada no PPP, sobre a palavra "Loucura".

Intentei que fosse imaginativa e colorida.
Espreito a divertida arte para me consolar do nevoeiro pegajoso de Janeiro.

Rio-me então um pouco, com os comentários dos meus companheiros de aventura fotográfica.
Já publicámos 65 palavras diferentes e variadíssimas interpretações delas!
A propósito da indicação do Gustaaf (Artspotter) que conhece logo estas coisas de arte moderna, fui investigar que a escultura alegre é de Niki de Saint Phalle (1930-2002), pintora, escultora e realizadora francesa cujas obras estão espalhadas em museus e jardins de todo o mundo.

A Wikipédia tem aspectos interessantes da sua biografia e percurso artístico, bem como inúmeras fotografias.

quarta-feira, janeiro 02, 2008

O Calendário






Tempo de os deitar fora e guardar as figurinhas dos meses, ignorando os sinais passados nos dias lestos.
Penso como as árvores: se a força me viesse da terra...talvez e sem data, me renascesse a seiva. Pelo ciclo das estações, uma sabedoria antiga e instintiva.

Gosto da teimosa Natureza, sobrevivente dos presságios.
Oxalá eu.

Fico sentada e aguardo esperança. Mas sendo que a pedra é a mesma, nota-se que afinal já não a tinha em pequena. A esperança. A espera, essa sim.

Será que se tornasse a ver pela quarta ou quinta vez "O Último Ano em Marienbad" perceberia, finalmente, no preto e no branco dos corredores vazios, como se mudam as ideias e se recolhem as memórias-pessoas-folhas-velhas?
Vou tendo as interrogações.

E cinicamente reparando nos modos alvares desta gente que emite sentenças: "a inversão da tendência decrescente", a propósito de mais de 800 mortos nas estradas portuguesas no ano de 2007. Pessoas e choros que não verão o novo ano, aparecendo como números simplificados que desmancham as percentagens.
Cada vez mais sinto a inversão dos valores.