terça-feira, outubro 16, 2007

O costume



Geralmente éramos três.
Nesta escultura, mulheres. Mas também colegas, vizinhas, amores ou amigos.
(estranho, o reflexo deste lugar de três lados no correr da vida minha, de três vidas na vida, uma constante).

Anos de silêncio e um dia de aniversário.
Ao mesmo tempo, um telefonema de acaso, num outro espaço de tempo e lugar.
Nunca percebi, nem perceberei, porque é que tantas pessoas preferem o fútil, o mais prático, o mais fácil. Superfícies.
À mão na mão, ao pensamento cruzado, ao riso e à lágrima em comum, a uma boa discussão ou a um silêncio frutuoso.

Relembro a canção de Chico Buarque:
"...Olá, como vai? Eu vou indo... e você? Tudo bem?..."

Infinitamente triste, um "Sinal Fechado".

11 comentários:

M. disse...

Sabes o que penso? Que por vezes se preferem as "superfícies" e o fútil porque aprofundar dói. E muito mais eu poderia dizer, mas ando em maré de ainda menos palavras do que o habitual. Não leves a mal.

Zé-Viajante disse...

Infinitamente certo.

teresa g. disse...

Se calhar não preferem... como diz m. a profundidade pode ser dolorosa. E mais lenta que os dias de hoje.

Beijos

Isabel disse...

Porque o medo tomou conta das pessoas B.
O medo das coisas erradas.
É natural ter medo, medo das coisas más.
Mas há quem tenha medo das boas, da intimidade, do calor de um corpo, do sabor de um beijo, da ajuda de uma mão amiga, de uma graça partilhada, de uma lágrima limpa por um dedo companheiro, uns berros a dois numa discussão acesa, de um silêncio cumplice.
Porquê.
Nuns casos por medo de ter e depois perder: triste
Noutros por habituação ao superficial: muito triste e muito grave.
Noutros por opção consciente pelo superficial: muito, muito triste e muito muito grave.

Não sei qual é a solução.
Sou ao contrário sempre, sempre a mergulhar a mergulhar no fundo das coisas... as superficies fazem-me patinar... demasiado lisas para mim...

Abraço-te com os braços cruzados não sobre mim, não sobre ti, mas sobre nós, o nosso fundo Nós.

Isabel

jlf disse...

...Nunca percebeste ou perceberás... Como muitos de nós sempre tivemos e continuaremos a ter dificuldade em compreender...

Rodrigo Fernandes (ex Rodrigo Rodrigues) disse...

As superfícies são tudo, a profundidade é nada. A mão na mão é tacto e contacto, o sorriso é visão partilhada, a lágrima é humidade numa face que se acaricia, a discussão são apenas vozes que se arranham para se insinuarem nos ouvidos. Tudo o que é bom e nobre na humanidade ocorre na interface. Pele, olhos, ouvidos são órgãos do contacto. As profundezas é que são futilidades, são a complicação do facilitismo, o pragmatismo pomposo e inútil, o pensamento recalcado, o sentimento comprimido.

a canção de Chico assinala a presença: Alô. Você aí? Eu aqui. É como dar-os-bons-dias comunica a presença.De resto, não serve de nada. Abertura na presença.

Ir mais longe, devassar as funduras, revolver os armazéns ou as prateleiras da dispensa, é cravar ferros em brasa em chagas em carne viva.

Eu sou pelo superficial, pelo epitelial, pelo pontilismo das impressões.

Rodrigo Fernandes (ex Rodrigo Rodrigues) disse...

P.S.:

Só depois li o comment da Isabel. Peço que não se sinta afectada pelo que escrevi, não foi para a contrariar. Acho que estamos pelo mesmo só que com visões revertidas dos lugares (o dentro e o fora, o íntimo e o sensorial). O oco, o côncavo, o interior, o subjectivo são profundezas que cavamos para nelas criarmos os nossos infernos privativos. É onde aprisionamos os outros como fantasmas. Daí Sartre dizer que o inferno são os outros. Ele fala de cadáveres sepultados dentro de nós.
Nós somos corpos, os corpos são superfícies, as superfícies são o lugar do encontro. Opto conscientemente pelo superficial, onde o paraíso são os outros. E não me vem daí tristeza nenhuma.

Mas como disse, estamos na mesma onda, só que revertemos o olhar.

Ou o meu deslizar pelas superfícies seja a subversão do olhar.

jawaa disse...

Vai havendo quem prefira a mão na mão...
Eu, nós, somos três. O ano passado encontrámo-nos no aniversário de uma de nós. Este ano vamos comemorar os 60 anos de amizade. Já festejámos em grande os 50!
A vida, a felicidade também é feita de pequenas coisas.
Um abraço

jotaeme disse...

Pois! Levezas, são sempre mais fáceis!E podem mudar conforme as circunstâncias...Profundezas levam mais tempo a construir e (ou) a apagar...
É difícil navegar nestes mares... de conveniências!
Jorge madureira

Maria Manuel disse...

Esta tua lembrança de «Sinal fechado» foi mais um sinal para mim... :-)

Beijo

nnannarella disse...

Esse preferir não passa de uma forma básica de sepultar o vazio. Quer queiramos fazer juízos de valor ou não, há gente mais inteligente do que outra. Há quem queira ver mais além e há quem não queira mesmo largar o umbigo.