quinta-feira, agosto 17, 2006

Por falar em...


Anos 60. Como hoje um dos amigos lembrou e artistas pintaram com a possível raiva, ou a impossível raiva. Como se escrevia em camuflagem (se fosse muito inteligente, ou aborrecido, ou cómico, haveria de passar na censura!). Que eram as alternativas, para nós. Pois era: para cantar, sem ser o fado do "Crime e Castigo", tínhamos de nos juntar num pinhal. E nem sequer se falava, explicitamente, contra a ditadura, ou o Salazar, ou a guerra ... assim, com tanta gente e não se sabendo a proveniência de todos ... Líamos poemas

"Luísa sobe
sobe a calçada ..."

Cantávamos baladas

"Pergunto ao vento que passa..."

Lembrei-me então da fotografia datada desse tempo sombrio.
Por aí estará o Mário Viegas. Paz na sua bela voz, saudade da sua diferença.
Ponho-a aqui e não é minha. Mas é um esconjuro. Lembrei-me dela, exactamente dela, não em nome da liberdade que usamos como um chapéu mas das ideias que hoje podemos trocar cruzadas.
Para gente muito nova não será explicável.
Éramos, também, pobres e soturnos. Podermos rir alto era um luxo e olhavam-nos mil olhos. Por isso, ríamos e cantávamos num pinhal.

22 comentários:

Teresa Durães disse...

Este tempo não vivi. Tenho histórias de gente mais velha mas nessas histórias que ouvi era de gente com medo e não se atrevia a nada. ainda bem que pelo menos cantaste.

:)

Bj

armandina maia disse...

O Mário Viegas calava tudo e todos, como acontece com alguns que fizeram da voz um belo instrumento de lazer, de paixão e de intervenção.por isso, ao ouvir o nome, "sinto" a serenidade buscada, trabalhada até à exaustão, para se esprair meticulosamente em cad sílab, que sustentava, como se estudadsse solfejo ou tivesse o vento dentro de si.
Continuamos a cantar nos bosques, mesmo que não vamos até lá.
parabéns!
armandina

Licínia Quitério disse...

Era assim, era. Cantávamos. E tínhamos medo. Medo de que a nossa voz fosse aprisionada. Fazes bem ao dar o teu testemunho. Para que saibam que esse medo viveu entre nós. Longo, longuíssimo tempo.
Beijo.
Licínia

vida de vidro disse...

Sei que era assim. :) E Mário Viegas foi, sempre, uma voz que se ouvia para lá das outras.
O que talvez seja difícil de entender para quem é muito novo é que cantar era uma forma de resistência. E de união.

Teresa Durães disse...

Posso dizer que trabalhar na função pública, nos anos em que não temos regime totalitarista (?), não se canta nem se fala. E quem tem a mania de contestar, como eu, num instante é arrumado (não aprendo...). Troca-se de poleiro. Tenta-se de novo. Desta vez num local menos politicarizado. E sou simplesmente uma técnica eheheeh nem chefe ou desejo de ser chefe. Agora há quintas e quintarolas e quem esbarra nelas está feito.

Agora não há união de nada :( e muitos que cantaram certas músicas agora cantam outras.

O medo continua mas ninguém sabe do quê. penso que José Gil tinha razão em muita coisa no seu livro
Portugal de Hoje, O medo de existir. Ninguém inscreve nada.

Era uma vez um Girassol disse...

Subscrevo tudo o que a Teresa acabou de escrever...
Venha outro...venham novas canções...tenho medo de dizer mais....!!!!!!
Bjs

Teresa Durães disse...

Girassol, não me refiro a ninguém daqui . A tanta gente que conheci no trabalho.

João Soares disse...

É bom inscrever a memória.
E concordo em grande parte com o depoimento da Teresa Durães.
Abraço amigo

Rosmaninho disse...

Lembro-me dos finais de 60 e dos 70 até ao quatro...
Lembro-me de ver minha mãe soltar uma gargalhada com o célebre discurso "...acabaram-se as vacas gordas, estamos em tempo de vacas magras..."
Tive dificuldade em atender a gargalhada, contei-a em local público e alguém de fato escuro (em dia de semana) quis saber quem eu era ( tão ignorante e ingénua jovenzita...) só em 75 compreendi a gargalhada e descobri quem me perseguiu...

Também cantei muito e ri em piqueniques nas matas de eucaliptos nos meus lugares...
Tinha medo e não sabia porquê, hoje tenho medo e sei porquê...

~*Um beijo*~

bettips disse...

Alguns de vós não repararam na palavar "esconjuro" nem na "liberdade que usamos como um chapéu". São as ideias fundamentais do meu post. E sei (tb o senti na pele, sou uma franja social que não cabe em estatísticas) que muitos mudaram de roupagem, outros refinaram os métodos. Mas obrigada na mesma por terem partilhado "as ideias que hoje podemos trocar cruzadas". Foi em nome DISTO que temos e de MUITOS que não tiveram medo. Mesmo que o autocolante LIBERDADE seja de pôr e tirar! E como "dona" do meu sítio, mais não digo/ouço porque não quero.

Aprendiz de Viajante disse...

Agradeço as palavras que deixaste no meu blog.

Gostei de te conhecer, voltarei...

Um bjo

greentea disse...

lembro este tempo sim e Mário Viegas tb; alias outro dia passou um documentario ou uma entrevista sobre Marcelo Caetano e nunca é demais relembrar como era mas reparei que os mais novos não ligaram, nada lhes diz..

bettips disse...

Olá "chá da saúde"! Enfim, sempre vais passando, gostei do teu comentário ...já me parece vivermos nas "Brumas de Avalon" . Mas e o teu blog? As tuas novidades? Espero que estejas balanced como costumas. Bjs

bettips disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
teresa g. disse...

Pobres? Não acredito! Cantavam no meio dos pinhais. Nós não cantamos no meio dos pinhais. E riam alto nos pinhais. Conheço muito boa gente que não ri alto em lado nenhum. Esses sim são pobres.
Beijinhos!

sa.ra disse...

olá minha querida!

Que belíssimo post!
Não foi o meu tempo, nem a minha experiência... mas, acho, haverá ainda muita canção e poesia para entoar na floresta...

Esta liberdade... sinto, não é ainda a LIBERDADE!

Oxalá essa conquista venha assim, em baladas e poemas sob abrigo da floresta... quem dera, permitíssemos, nos desabrochasse na mão...

beijinho
dia muito feliz!
um dia muito feliz!

MaD disse...

Bettips:
Obrigado por lembrar esses velhos tempos, que também conheci.
Até o preto e branco da foto mos recorda e me deixa alguma nostalgia.
Mas, hoje, tudo é diferente, embora, mágoas também existam. E grandes.

bettips disse...

Sim, cantares mas mágoas. Felizmente que nos encontramos por aqui, quem se conhece/reconhece, apesar de diferenças muitas. Liga-nos sobretudo, sinto, uma esperança, uma bondade, um amor pelo belo simples. O meu ramalhete está lindo! Beijinhos a todos vós, meus queridos. Haja amanhã! Haja manhã!

Teresa Durães disse...

Olá boa noite.

resolvi reabrir o Voando.

Bjs.

vida de vidro disse...

Deixo-te um beijo. Obrigada pelo comentário que deixaste lá no Vida! :)**

Era uma vez um Girassol disse...

Vim ver se já tinhas novo post...
Também não me referia a gente blogueira no meu comentário...
Obrigada pelos parabéns à pequerrucha...
Bjs

Diafragma disse...

..." sobe que sobe
não custa nada..."