domingo, junho 10, 2007

Os desafios e os caminhos do Romântico I




Passo por questionários, prémios e essas correntes assim, um bocado indiferente, confesso. Tal como a maior parte dos cartazes de anúncios vários e "forwarded messages". Conselhos e conceitos que, não sendo passados a outros, me dão a sensação de estar a contribuir para as trevas ou o prejuízo do mundo.
Que seria salvo e clarificado com o mandar 5 vezes uma qualquer ladaínha sobre a amizade. Ainda por cima, geralmente, ou em brasileiro ou com deficiente tradução.

Demasiadas formas (e fôrmas ???) para o meu pé livre.
Acho que já me expliquei em tempos. Plenamente justificada pelo que vivi antes de estar aqui. Porque recordo os "Inquéritos" que na jovem adolescência se passavam entre nós e, com a ajuda de "um irmão de uma", circulavam também entre os rapazes: geralmente, cadernos de argolas, com perguntas a que cada uma/um respondiam, sobre música, livros, gostos, férias, cinema...quem me dera ter guardado um deles, para me explicar melhor.

Estou a ver folha e letras na minha memória. Passavam de mão em mão. Sei que descobríamos, ao recebê-los, escalpelizar as respostas e até a caligrafia, "amar" cada vez mais a paixão escondida ou a amiga predilecta...que confessava partilhar prazer num mesmo filme, ou poeta, ou gostar do mar, duma determinada cor... "Diga uma frase que a/o tivesse impressionado"...
Era o tempo das grandes tentações e ilusões. Em que se faziam diários e se trocavam confidências, receitas para ficar mais morena com misturas de tintura de iodo, passar o cabelo com sumo de limão, fortificá-lo com gema de ovo. Comprar água de rosas nas farmácias, avulso, ou macerar violetas, ou alfazema do monte, em álcool para obter perfume. Ou aclarar madeixas com ervas colhidas no pinhal... mil ideias imaginativas para quem não tinha "semanadas" e andava a pé para poupar cinco, dez ou quinze escudos.

11$00 custava um bilhete de cinema, nas tardes clássicas do Batalha, para a intelectualidade que amava Antonioni ou Greta Garbo. Ou o neo-realismo italiano. Ou as densas racionalidades de Truffaut, os romances barrocos de Visconti.

E recordo que vi "Ma nuit chez Maud" ou "O último ano em Marienbad" várias vezes, tal a densidade das ideias e imagens. Não sei, hoje, se os percebi, apesar de sentir que o meu ser é forrado de todas essas interrogações, filosofias de vida, ensinamentos de cultura, tímidos ensaios de liberdade espiritual, princípios estéticos ou simples pulsar de ideias sobre o mundo.

Falo dos inícios e meados dos anos 60.
Onde nada nos era facultado e muito tínhamos a descobrir.

5 comentários:

jawaa disse...

Nós fomos privilegiadas por termos vivido tudo isso, por nos lembrarmos e podermos ainda transmitir aos que ficam.
Os que nos amam e compreendem, admiram a nossa força, que foi imensa.
Eles, os mais novos, têm outros desafios, têm de lutar de outra maneira, e a nossa missão não acaba nunca, porque entendo que não estamos aqui só por acaso. Cumpre-nos mostrar que a simplicidade da vida é o que perdura, a natureza isso nos ensina e a natureza somos nós...
Beijinho

Paulo disse...

Muito bonito este teu post, que também me transportou a outros tempos, outras memórias. Bj.

Meg disse...

Outros tempos, outras memórias.
"Onde nada nos era facultado e muito tínhamos a descobrir".
E como descobrimos. Em boa hora!
Um abraço muito amigo

jorge esteves disse...

Não sou assim a modos que muito calhado a efemérides (até costumo dar as prendas em dias de vontade e nos aniversários, por vezes, nem dá jeito a um simples abraço). Isto porque, particularmente, engalinho com o 10 de Junho, ao qual já ouvi chamarem de 'o Dia da Raça'!...
Bom, mas isto a propósito, disso mesmo; ou seja: este, aqui, foi o melhor dia 10 de Junho que achei! E deixa-me fazer-te uma invejazinha: eu ainda tenho religiosamente guardado um desses inquéritos! Que coisas espantosas eles contam desses anos dourados! Que tão poeticamente aqui retrataste!...
Obrigado por este passeio!
Agora vou apanhar o 21 para a Constituição...
Abraços!

jlf disse...

Anos 60, onde muito tínhamos a descobrir...
Nem mais.
Já que era cada vez mais o que se adivinhava.
Isso.
E cada vez maior a ânsia de saber.
Exacto.

Então não me lembro dos diários e dos inquéritos?!...
Olá se lembro.

"O último ano em Marienbad"?
Também repeti.
Como repeti alguns do Ingmar Bergman. Nada lineares.
Tu no Batalha, eu, por exemplo, no Estúdio do Império...

Difícil. Mas memorável tempo.
zl